quinta-feira, 28 de agosto de 2008

escritores de lápides

Há pessoas com cara-de-pau. E há também agentes fúnebres. Creio ser uma profissão em que é necessário, não ofendendo deliberadamente ninguém, ter a maior cara-de-pau de sempre. Vejamos, lucram com o infortúnio dos outros… certos membros do governo também o fazem, mas o emprego destas agências é assumido e respeitado. Esses membros do governo já não. Onde quero eu chegar? A lado nenhum provavelmente, mas receio que mais tarde ou mais cedo irei estar nas mãos destes agentes fúnebres. Regozijo-me a pensar em como seria a minha última cerimónia. Temos variadíssimas hipóteses. As mais tradicionais são o enterro e a cremação. Contudo penso que o embalsamamento será a qual com que me identifico mais. Na verdade gostava que me embalsamassem e me pusessem no hall de entrada da minha casa, ao lado do bengaleiro. Sempre gostei de receber visitas… A nossa vida é feita de etapas, e em cada uma delas, haverá sempre alguém que lucre com elas. Baptismo, a educação, faculdade, casamento, divórcio e eventualmente a morte… Parece-me justo que quando passamos por estas etapas, haverá alguém a lucrar, pois também, cada um festeja como quer, agora no nosso funeral, já me cheira a algo… Para já não compreendo porquê é que nos enterram com o nosso melhor fato! Se é para dormir para sempre não tem mais lógica ir com o nosso melhor pijama? E para quem é cremado? Sempre que vou a um churrasco envergo sempre uma camisa havaiana e um belo par de chinelos! Enfim, é de facto doloroso e penoso ir às compras para a cerimónia; escolher o caixão, a madeira, o acabamento, a urna… e também a lápide. A lápide será a nossa marca para a posteridade, convém ter um bom par de linhas em que se expressa o sentimento pelos que cá ficam. Gosto de pensar em como será a vida da pessoa que escreve os textos para as lápides. É provavelmente uma vida pacata e serena. Mesmo assim, estes senhores são os que têm ainda mais cara-de-pau. Penso que realmente o trabalho que fazem é venerável, por mim, em todas as lápides de familiares meus falecidos, o texto está sempre solene e conciso, mas, dentro da pacatez da vida de um escritor de lápides, existe sempre o momento em que expressam o seu maior potencial de cara-de-pauzice… O que será que se escreve na lápide de um hipocondríaco?

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